quinta-feira, 17 de junho de 2010

A heresia ditatorial do “branco”

Por Dalton L. C. de Almeida

As reproduções de páginas ricamente trabalhadas de bíblias copiadas a mão por monges da Europa medieval, em geral, surpreendem os observadores pela riqueza de detalhes e quase inexistência de espaços em branco.


Tomadas por desenhos, arabescos, pinturas, texturas e o que mais fosse possível, cada página era, e é, uma obra de arte à parte, transformando o volume de escrituras sagradas em muito mais do que uma “simples” bíblia, e sim, em uma exposição compilada.

No dia 23 de maio a Folha apresentou sua reforma gráfica, seguindo, ao contrário de sua tradição de pioneirismo na área, o Estado de S. Paulo.

Neste processo de muitos aspectos modificados, como fonte do texto, editorias, cadernos, uso de cores entre outros, o maior destaque, ficou exatamente na impressão de “espaço ganho”.

O veículo ampliou a “áreas brancas”, as mesmas que eram “temidas” pelos medievais, talvez, preocupados com o que faria a mente de um leitor que pudesse “descansar” a vista, dando um “tempo” antes de continuar a leitura da “Palavra de Deus”.


Na nova editoração, em especial online, o observador-internauta tem a clara “impressão” de vazio, devido à grande quantidade de áreas brancas e brilhantes, que permeia os blocos de informações “suspensas” por todo o portal. Talvez a intenção fosse buscar um ar mais “clean”, mas ao contrário de O Estado Online, em que o vazio foi preenchido por um azul-bebê de gosto duvidoso e que evita o ar de “falta de algo”, o espaço branco, na Folha Online, efetivamente evidência algo que, aliás, até mesmo a versão impressa não escapou: uma real falta de conteúdo.

Para um leitor tradicional da versão antiga, o portal da Folha Online, que costumava “perder” seus leitores em meio a tanta informação, está incomodamente vazio.


Como toda a reforma, é importante que aspectos positivos sejam preservados e aspectos negativos devidamente extirpados, no caso da Folha Online, o novo projeto prevê um ambiente de leitura e interação mais amigável aos não acostumados a leitura online e/ou jornalística. O problema é que a falta de informações, provavelmente será sentida por aqueles que buscavam a Folha como uma fonte rica.

Na era da virtualização, velocidade, superficialidade e falta de tempo, a Folha curva-se à ditadura do “branco”, para descanso, incrementado pela lógica da informação rápida e curta.
O que será que hão de fazer tantas mentes expostas a áreas de descanso visual? A resposta é uma incógnita, mas sem dúvida, eriçaria os ânimos e conturbaria os sonhos dos copistas medievais preocupados com as “heresias mentais advindas dos espaços em branco”.

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